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Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Assim está muito bem

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Houve uma altura em que pensámos ter três filhos. Foi pouco depois de a bebé Alice nascer, quando eu ainda andava parvinha da occitocina e descobrimos que nos tinha calhado outra bebé pouco chorona e dorminhoca. Mas depois começaram os terrores nocturnos da Inês e, a juntar à dentição da Alice, foi um ano de pura privação de sono (eu sei que há pais que são privados de sono durante mais tempo, mas cada um com os seus problemas, sim?), o que serviu para me desmotivar completamente de ter outro filho.

Além disso, feitas as contas, o nosso carro dá para dois filhos, a nossa casa é ideal para dois filhos, os nossos ordenados não esticam para mais do que dois filhos, as duas voltaram a dormir bem e a vida é perfeita assim com dois filhos.

 

No entanto, a Inês está sempre a pedir-me um irmão. Já lhe expliquei que tomo um comprimido todos os dias para não ter bebés na barriga, mas ela diz que qualquer dia me esconde os comprimidos. Já lhe expliquei que só tenho duas mãos para as agarrar ao atravessar a estrada, uma de cada lado, e que como iria eu agarrar uma terceira criança, mas ela diz que agarra o papá ou que uma delas pode ir às cavalitas. Já lhe expliquei que depois, quando nascesse o bebé, eu ia ter de cuidar do bebé durante muito tempo e não poderia brincar com ela e com a Alice, mas ela disse que posso perfeitamente deitar o bebé a meu lado enquanto brinco com elas. Há uma solução para tudo, portanto. Calculo que também tenha uma solução para as estrias e as mamas descaídas, mas ainda não fui por aí. 

 

Apesar de tudo, apesar de ser a única nesta casa a defender que duas filhas já chegam (felizmente, o corpo é meu e acho que a última palavra ainda é minha), às vezes ponho-me a pensar como seria ter outra. O caos. A desordem. O barulho. Os banhos. As noites. As fotos. As viagens em família. O riso de todas ao mesmo tempo. As sessões de cócegas. A história à noite com as três em cima de mim. E depois encontro blogues de famílias numerosas que me fascinam, como o recentemente descoberto seis mais dois, e dou por mim a vasculhar os arquivos e a lê-lo de uma ponta à outra e a não evitar uma certa inveja da casa cheia e das atividades em família que parecem sempre um acontecimento. 

Vou continuar a ler, este e outros, até perceber como é que estas mães fazem para terem dias mais longos e para conseguirem não andar sempre aos berros pela casa. Quando perceber como se faz e conseguir aplicar isso na minha própria vida, pode ser que consiga ter boas notícias para dar à Inês. Até lá, a vida assim a quatro* está muito bem e recomenda-se.

 

* e mais uns quantos gatos.

Desarranjos

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A minha máquina de costura foi a arranjar pela segunda vez. Da primeira vez foi para ajustar a tensão, cobraram-me 5 euros, mas veio de lá pior do que estava. Voltei, reclamei e disseram-me que, provavelmente, eu é que não sabia enfiar a linha. Comecei-me a rir, não que eu ache que sei meter a linha como ninguém, mas por achar que uma pessoa não desaprende a pôr a linha assim de um dia para o outro. Três anos depois de uso semi-intensivo, a máquina perde tensão e eu é que deixei de saber pôr a linha. Quer-se dizer.

 

Seguiu-se um pequeno bate-boca entre cliente e funcionária, que lá acedeu em voltar a chamar o técnico e averiguar em profundidade de que males padece a máquina. Demasiados dias depois, telefona-me para ir buscar a máquina. Como previsto, a máquina não sofre de nenhum mal, a tensão está ajustada, como se pode ver pelo tecido com pontos que o técnico deixou, a dona é que não sabe meter a linha. Posto isto, dá para cá dez euros, o dobro do que pagaste da última vez, que é para aprenderes a não nos fazeres perder tempo.

 

No entanto, nem tudo está perdido. É que, assim como desaprendi a enfiar a linha de um dia para o outro, também devo ter aprendido a enfiar a linha de um dia para o outro, porque desde que veio do não-arranjo que já fiz uns calções, umas bainhas e estou mesmo quase a acabar a manta. Desta é que é.

Iletrada

Ao sair da Feira do Livro (contexto importante para o final da história), um senhor parou a olhar para a Alice, perguntou se eu era a mãe e se conhecia o poema do Alfredo Marceneiro sobre as crianças. Respondi-lhe, claramente sem pensar nas consequências, que não, mas que teria muito gosto em conhecer.

Começou por recitar,

 

"É tão bom ser pequenino,
Ter pai, ter mãe, ter avós,
E ter esperança no destino
E ter quem goste de nós"

 

e depois, como deve ser uma infâmia não conhecer a poesia do Alfredo Marceneiro, desatou a recitar vários poemas de Almada Negreiros e outros de que já não me lembro, porque entretanto perdi-me no raciocínio, terminando com uma citação de Fidel Castro (juro) sobre a necessidade de ler quando nada mais há a fazer. No fim, pergunta-me: 

"Acendi uma chama? A menina promete-me que vai começar a ler?"

 

E rodopia, triunfante.

Há sempre uma próxima vez

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Tinha planeado visitar alguns monumentos, museus, galerias, ir até à minha antiga casa, ir aos restaurantes de antigamente, mas acabei por nao fazer nada disso. Os restaurantes de antigamente já nao existem, os monumentos parecem Versailles nos feriados da Páscoa, com filas de 3 horas para entrar, e a minha antiga casa nao me iria trazer nada de novo. Decidi, assim, andar, andar, andar. Andar muito a pé. Andar até ganhar bolhas (check) e me incharem os pés (check). Andei sem rumo e sem mapa, com aquela seguranca de quem sabe por onde anda e aproveita cada passo para observar cada canto, cada pessoa, o céu quase sempre azul e os meus pensamentos que divagavam ora em 2006, ora em 2015.

 

É inevitável fazer comparacoes. Em 2006 nao havia tantos turistas, nao havia tantos prédios novos, nao havia tanta escolha de restaurantes, lojas e centros comerciais. Em 2006, já se comecava a investir na cidade e havia sempre obras aqui e ali, mas agora as obras sao monumentais e omnipresentes. Para passar por baixo das Portas de Brandeburgo é preciso ter cuidado para nao pisar ninguém e para conseguir tirar uma fotografia sem turistas é preciso apontar para o céu.

 

Mas Berlim é, antes de mais, uma forma de vida. Um estilo de vida descontraído que nao se encontra em Lisboa. E este estilo de vida ainda existe, o Berliner Flair ainda cá está para nos seduzir e encantar. Berlim tem aquele encanto (in)explicável que nos faz encontrar sempre graca na cidade. Nunca senti isso com Lisboa nem com nenhuma outra cidade. Continuo a sentir-me muito bem aqui, a sentir-me em casa. Mas, já dizia o outro, home is where your heart is. E o meu coracao está em Portugal, numa pacata vila à beira do mar, numa casa com duas criancas adoráveis e um homem que eu adoro (estou cheia de saudades).

 

O meu voo parte daqui a poucas horas e estou feliz por me ir embora. Foi a duracao certa para uma viagem egocentrica de regresso ao passado, onde me reencontrei no presente. Nao fiz tudo o que queria fazer, mas o que faltou fica para a próxima. Berlim nao vai a lado nenhum.

 

(ficaram algumas coisas para dizer sobre os amigos que cá deixo, mas terá de ficar para quando pisar solo portugues)

Revisitar o Muro de Berlim

Berlim é daqueles sítios onde se pode ouvir grego, japones e hebraico enquanto esperamos pelo eléctrico. Esta multiculturalidade faz-nos sentir no centro do mundo, mesmo que seja só no centro da Europa. Nao me admira que muita gente queira vir a Berlim, para Berlim. Toda a carga histórica é simplesmente fascinante e, a par disso, a oferta cultural e a diversidade sao os chamativos perfeitos para visitar esta cidade. E, por isso, nao seria de pasmar que Berlim estivesse tao cheia de turistas. Mas eu pasmei. Porque de todas as vezes que visitei o Muro, sozinha ou com visitas, nunca tinha visto tanta gente a fazer este trajecto. Encontrava, no máximo, 6 ou 7 pessoas ao longo do passeio da East Side Gallery. Agora, fotografar o Muro é tao difícil como fotografar a Mona Lisa no Louvre: há sempre um japones que se mete à frente.

 

Desde há oito anos para cá, voltaram a pintar o Muro, massificaram-no, fizeram dele engodo aos turistas sequiosos de carimbarem o seu "passaporte da RDA", deslocaram uma parte do Muro para permitir que se passasse para o lado de lá (na margem do rio, onde agora as pessoas se podem sentar num café, num barco-café, numa praia a fingir ou simplesmente na relva) e houve até quem se lembrasse de encher um dos portoes com cadeados de amor, daqueles como há na ponte francesa. Uma coisa que nao existia há 8 anos, mas que agora faz muita gente parar (será que pensam que sao cadeados de amor entre alemaes de leste e de oeste?).

 

Se por um lado isto me irritou, toda esta massificacao e comercializacao de Berlim, por outro lado percebo que este é apenas o rumo natural que as cidades tomam quando deixa de haver fronteiras e há livre transito dentro da Europa. O Muro ja nao divide nada em ninguém e tem agora, finalmente, o Memorial merecido que nao deixa esquecer outros muros por esse mundo fora.

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