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Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Nova etapa

deixar as fraldas.jpg

Quando a educadora me veio dizer que a Alice tinha pedido para fazer no bacio, "Está na altura, mãe!", eu não queria acreditar. A minha bebé largar as fraldas, já? Confesso que, a par da desconfiança de que estivesse mesmo na altura (mas uma mãe não sabe ver essas coisas?), não me tinha ainda preparado psicologicamente para isto, para as corridas à casa-de-banho, para perguntar dez mil vezes por dia se quer fazer chichi, para as mudas de roupa. Era suposto ser só lá para a primavera... Convenhamos, com este frio, ninguém se lembra que a primavera já chegou!

 

Mas isto está mesmo a acontecer, porque a Alice anda radiante e este início tem sido um sucesso. Agora, na mala do Sport Billy cabem também uma muda de roupa e um bacio portátil que já vem do tempo da Inês e que ainda hoje deu muito jeito no supermercado. Só não sei como vou fazer amanhã na viagem para o Alentejo, mas comigo não há direito a fralda posta só porque "vamos ali". Só põe fralda para dormir. De resto, é prego a fundo e rezar para que os descuidos não sejam muitos.

 

(entretanto, adoro como a Alice, em dias de muito vento, me segura o cabelo para que não voe. a irmã fazia o mesmo. quando o instinto protector nos faz sorrir)

Upcycling de roupa

Volto a falar em roupa. Desta vez não se trata de roupa nova, mas sim de roupa usada, velha, em mau estado, fora de moda. O que fazer com os trapos?

Deitar fora, simplesmente por deitar, está fora de questão por todo o impacte ambiental que isso acarreta.

Durante muito tempo, costumava vender a roupa em bom estado mas que ou já não me servia ou já não queria. Há várias lojas de roupa em segunda mão que compram a nossa roupa, havia uma em Algés e agora há uma em Sesimbra. Não era pelo dinheiro que rendia, porque não rendia nada. Quando eu digo nada, é mesmo nada. Quase nem dá para ir à Zara comprar um trapo novo feito no Bangladesh...

Fazia-o para dar uma segunda oportunidade à roupa que ainda estava boa. Mas a trabalheira que me dava lavar a roupa, passá-la a ferro, ir à loja e voltar lá dali a poucos meses buscar a roupa que não foi vendida, pois a venda é à consignação, e acabar por deitá-la no contentor da Humana, não compensava o esforço. Passei, assim, a deitar a roupa logo no contentor da Humana.

Mas depois de ver naquele documentário de que vos falei no post anterior o que acontece à roupa que doamos (mesmo tratando-se no filme do universo americano, nada me garante que as roupas que eu doo têm o destino que eu acho que deviam ter), decidi mudar de estratégia: reutilizar ou reaproveitar roupa. Em inglês, o termo upcycle designa o processo de converter artigos velhos ou inutilizados em artigos úteis e, por vezes, ainda mais bonitos.

E foi assim que fui repescar duas peças de roupa da Inês, um casaco e umas calças, que tinham nódoas impossíveis de limpar (tentei tudo ou, bom, quase tudo). O casaco ficou com as mangas inutilizadas e as calças tinham uma das pernas com uma grande mancha de qualquer coisa indecifrável - seria cola??

Em vez de os deitar fora, cortei as partes com mancha e transformei-os em peças úteis e quase novas.

casaco antes.jpg

 O antes: manga com uma mistura de nódoa de chocolate e bolor...

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 O depois: um casaco novamente branco.

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No caso deste casaco, nem é preciso saber costurar, pois dá para fazer tudo à mão: cortei as mangas e cosi uma fita de renda em toda a volta. Tão simples e ficou logo com outro ar. 

 

No caso das calças, não há foto do antes, mas o depois ficou bem giro, muito ao estilo que a Inês gosta. Tem brilhantes? Então visto!

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Depois de fazer a bainha, usei a mesma fita de renda do casaco e colei umas pedras brilhantes com uma pistola de cola quente. E ela adorou, mesmo achando que tinha poucos brilhantes...

 

No passado, já aqui dei outras ideias para reaproveitar roupa velha: meias, remendos em crochet, camisas de homem, decotes de t-shirts e dar graça a t-shirts sem graça.

Saber o que se compra

Na mesma semana em que vi este documentário, li também este artigo do Guardian que aponta o dedo às prácticas exploratórias da Lidl ao vender umas jeggings por menos de 6 libras. É claro que dá muito jeito comprar roupa baratinha, mas já pararam para pensar no que está por detrás destes preços, quem lucra e quem é prejudicado? Se não, leiam o artigo.

No que me parece ser uma análise muito bem fundamentada do que está por detrás do fabrico de roupa nos países subdesenvolvidos e um estudo aprofundado do verdadeiro preço das coisas, o artigo acaba com uma fulminante acusação de exploração à cadeia de supermercados. Em nada me admirou. Quando morava na Alemanha, a Lidl era acusada de oferecer condições duvidosas aos seus funcionários e implementar prácticas polémicas

Ainda assim, sou cliente regular da Lidl. Não costumo comprar lá roupa, mas não me livro de dizer que compro noutros grandes distribuidores que praticam preços que nos deviam fazer pensar sobre as condições em que são fabricados. Toda a gente se lembra do trágico desabamento em Bangladesh que levantou a cortina sobre as condições destes trabalhadores, se bem que era coisa que toda a gente já sabia, só não queria ver.

 

Decidi mudar isto. Na verdade, nem sou muito de comprar roupa e até já faço roupa para mim. Cedo cada vez menos a compras de impulso e a moda irrita-me. Por isso, se até compro pouca roupa, decidi passar a comprar de forma mais consciente.

Comecei por repescar uma entrevista à Rosa Pomar que li há uns tempos. A Rosa é sempre uma inspiração e nesta entrevista ela diz uma coisa tão simples, mas tão difícil de pôr em práctica de forma consciente: "o que importa é saber o que se está a comprar". Basicamente, é olhar para a etiqueta.

 

Passei uma vistoria à minha roupa e o resultado não me surpreendeu muito: Made in China, Bangladesh, Indonesia, Tunisia, India, Morroco. Uma vergonha de roupeiro. Resta-me saber que alguma destas peças foram compradas em segunda mão, se é que me serve de algum consolo... Nem as marcas portuguesas se safaram. Ora vejam.

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 Vestido da Lanidor. Made in China. 

 

Etiqueta Salsa TUN.jpgCalças da Salsa. Made in Tunisia.

 

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 Calças da Salsa. Made in Portugal! 

 

Ah, espera! A mesma marca tem políticas diferentes?!? Caso em que olhar ou não para a etiqueta pode mesmo fazer toda a diferença. Na minha consciência, pelo menos.

 

Ando a fazer um levantamento das marcas, nacionais ou internacionais, que implementem uma ética de responsabilidade social e ambiental. Já descobri algumas, umas com roupa gira, outras nem por isso, mas todas com preços "astronómicos" se as compararmos com a Primark. Por outro lado, trata-se de peças únicas e qualidade duradoura. Mas muito mais do que isso, é uma análise à nossa consciência: será que estamos a contribuir para a infelicidade de alguém porque compramos um trapinho que usamos sem pensar meia dúzia de vezes?

 

Sim, voltarei a este assunto muito em breve.

 

 

 

Faits divers

pôr-do-sol.JPG

 

Hoje de manhã, quando saí de casa para beber café, ouvi o chilrear dos pássaros e o silêncio deixado pela breve ausência de carros a passar na estrada lá em cima e senti-me profundamente sortuda por morar fora da cidade. Nunca pensei dizer isto, eu, que sempre me considerei citadina, mas a verdade é que, a maior parte das vezes, sinto que a nossa mudança para aqui foi um upgrade maravilhoso ao nosso estilo de vida. Um estilo de vida mais calmo e próximo da Natureza. Não sendo a Natureza só feita de pássaros a chilrear e arco-íris na Arrábida, a chegada do bom tempo traz consigo novos inquilinos. Confesso que as minhocas e lesmas gigantes que entram pela fresta da porta não me incomodam, pego nelas com um palito e meto-as no canteiro. Também já me comecei a habituar às borboletas da noite que entram quando vou fechar as portadas antes de me deitar. Mas quando, no outro dia, a professora de yoga nos mandou visualizar um prado verdejante durante a fase de relaxamento, percebi que tenho um problema que não tinha na cidade e que o meu problema se agudiza com o bom tempo. Ao imaginar um prado verdejante, não consegui relaxar coisa nenhuma porque havia demasiados gafanhotos a saltar à minha volta.

 

É claro que isto não é um problema a sério. Mas não quero falar sobre Bruxelas.

Se puderes olhar, vê. Se podes ver, repara.

Não tenho o dom da palavra, pelo menos da falada. Sou aquele tipo de pessoa que, numa festa, passa facilmente despercebida. Noto isso quando sou a última a quem passam o champanhe ou quando ninguém parece ter conversa para puxar comigo (isto faz com que, por outro lado, tenha o dom da invisibilidade, o que, convenhamos, também pode dar jeito). Prefiro grupos pequenos onde consigo ser eu mesma do que grupos grandes, especialmente quando há muita gente que não conheço, onde sinto sempre que tenho de me obrigar a participar nas conversas e acabo incomodada com o pouco interesse que desperto nos outros. Não sou, nem nunca fui, o centro das atenções, a miúda que brilha na festa e reina na pista de dança, a pessoa divertida e extrovertida que tem sempre uma piada na manga ou a resposta certa que cai bem em todas as ocasiões. Não sou, pronto.

Em contrapartida, sei que neste blogue e nas redes sociais em geral, há sempre alguém que me presta atenção, que comenta aqui e ali e dá a sua opinião, que faz like às minhas parvoíces no Facebook ou elogia o meu novo vestido no Instagram quando, na vida real, mais ninguém o faz. Bom, não quero ser injusta para a minha filha mais velha que adorou o vestido, quis ver todos os botões e pormenores e fartou-se de me gabar como me ficava bem. Fora isso, contudo, ninguém notou que trazia vestido um vestido com mais de 40 anos, que mandei arranjar à minha medida. "Mas as pessoas não adivinham", dizem-me vocês, "como queres que as pessoas saibam que trazes um vestido da tua avó se não lhes dizes"? Mas a verdadeira questão é: na vida real, as pessoas nem sequer reparam, pois não?

 

É claro que isto não é sobre um vestido. É sobre mim e sobre mim nas redes sociais. Sobre a liberdade de expressão que achamos que temos, mas que não passa de uma ilusão e nos pode meter em sérios sarilhos por causa de um comentário menos feliz num qualquer grupo virtual. Sobre como me tenho relacionado com as redes sociais ao longo dos anos e como a tendência está a ser para me afastar cada vez mais. Sobre como este blogue já foi tão íntimo e pessoal e, hoje em dia, não passa de um blogue displicente sobre costura, comida saudável e vestidos de velha. E sobre como eu não preciso de nada disto para ser feliz.

 

 

* O título é de José Saramago, em Ensaio sobre a Cegueira. E não, o blogue não vai acabar.