Regresso
Voltei de Berlim no dia 2 de Julho de 2007, exactamente 4 anos depois de ter chegado. A coincidência das datas foi isso mesmo, uma coincidência, que logo assumi como um sinal do universo que me dizia que era o fechar de um ciclo e o início de outro, e que isso só podia ser bom. E foi. Apesar de os primeiros meses terem sido conturbados: voltar para casa dos pais, começar a ganhar o ordenado português, perceber que os meus amigos, depois da euforia inicial do meu regresso, se esqueciam que eu continuava por cá. Depois arrendei uma casa em condições pouco invejáveis e, dois dias depois do concerto dos Interpol no Coliseu - das coisas que eu me lembro - conheci aquele que é hoje o meu amor, o pai das minhas filhas. Sem dúvida, o fechar de um ciclo, o início de outro, e isso foi bom.
Voltei a Berlim apenas uma vez, logo em 2008, quando as saudades ainda não eram muitas. O então ainda apenas namorado, mas já o amor da minha vida, foi comigo e pude mostrar-lhe, com algum orgulho pouco disfarçado, os sítios aonde ia, as ruas por onde passava diariamente, os museus, o rio, o brunch ao domingo no Frida Kahlo. A nostalgia ficou guardadinha dentro de mim e assim permaneceu até há uns meses em que uma visita de Berlim despertou em mim toda a nostalgia acumulada. Não aguentei e planeei o regresso. Tenho de ir sozinha, disse-lhe. Ele percebeu, como percebe sempre, que com ele não poderia falar alemão nem ter o espaço necessário para curtir a minha nostalgia. Basicamente, reviver. Reviver o trajecto diário da linha U6 de fones nos ouvidos e, de preferência, com a mesma música. Na altura, era muito Interpol, Nick Cave, Bloc Party, The Shins, American Music Club, Arcade Fire. Tirando estes últimos, não será a música para a qual ando com mais paciência e temo que poderá fazer-me mal à alma ouvir a Leif Erikson enquanto espero pelo metro na Leopold Platz.
Talvez escolha, assim, alguma coisa mais soft, mas sempre igualmente triste, que eu nunca fui uma pessoa demasiado alegre. Uma Sharon van Etten (qualquer uma), por exemplo, será a banda sonora ideal para passear nas margens do Spree, ou a Doused dos Diiv (esta já não é tão triste) quando me sentar nas escadinhas da Alexander Platz a observar. Quando sair à noite, sem dúvida uns Hot Chip (One Life Stand) ou uns Yeah Yeah Yeahs (Head will Roll) - no pun intended. E depois há aquelas músicas que poderiam perfeitamente, pela sonoridade que vivi entre 2003 e 2007, fazer parte da banda sonora de Berlim: 5 Chords dos The Dears ou What Did My Lover Say? (It Always Had To Go This Way) dos Wolf Parade e, claro, mas não só pelo nome, Berlin Sunrise dos Fink. Já me estou a imaginar aos saltos no Magnet Club ao som destas músicas.
Mas não, desta vez não vai haver Magnet Club nem Karrera Klub, porque - atenção: caretice! - à noite já só quero mesmo dormir, especialmente quando vou passar 5 noites sem ter de me levantar para pôr ninguém a fazer chichi ou acalmar um pesadelo. Vai haver, sim, muitos passeios que já revi na minha cabeça vezes sem conta, reencontros que são capazes de me deixar com a lágrima no olho, e no fim só espero sobreviver intacta, fazer uns contactos (pensavam que era só boa vida??), falar muito alemão até desembaraçar a língua e comer tantos Pretzels quantos a minha pseudo-intolerância ao glúten mo permitir.
Não me aguento.
Faltam 3 dias e sinto-me como uma miúda de 6 anos na véspera do primeiro dia de escola.
Espero tirar fotos melhores desta vez.