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Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Bolas de Berlim... sem creme

Um blogue que não é de culinária (apesar de ter algumas receitas)

Faits divers

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Hoje de manhã, quando saí de casa para beber café, ouvi o chilrear dos pássaros e o silêncio deixado pela breve ausência de carros a passar na estrada lá em cima e senti-me profundamente sortuda por morar fora da cidade. Nunca pensei dizer isto, eu, que sempre me considerei citadina, mas a verdade é que, a maior parte das vezes, sinto que a nossa mudança para aqui foi um upgrade maravilhoso ao nosso estilo de vida. Um estilo de vida mais calmo e próximo da Natureza. Não sendo a Natureza só feita de pássaros a chilrear e arco-íris na Arrábida, a chegada do bom tempo traz consigo novos inquilinos. Confesso que as minhocas e lesmas gigantes que entram pela fresta da porta não me incomodam, pego nelas com um palito e meto-as no canteiro. Também já me comecei a habituar às borboletas da noite que entram quando vou fechar as portadas antes de me deitar. Mas quando, no outro dia, a professora de yoga nos mandou visualizar um prado verdejante durante a fase de relaxamento, percebi que tenho um problema que não tinha na cidade e que o meu problema se agudiza com o bom tempo. Ao imaginar um prado verdejante, não consegui relaxar coisa nenhuma porque havia demasiados gafanhotos a saltar à minha volta.

 

É claro que isto não é um problema a sério. Mas não quero falar sobre Bruxelas.

Há um ano

Sem tempo para dar corpo a posts novos, repesco um post antigo, escrito há coisa de um ano, quando nos mudámos para cá. Tenho-me lembrado muito disso, que fizemos o nosso primeiro aniversário nesta casa e nem o celebrámos. Acho que é por parecer que sempre morámos aqui. Mas ainda hoje estava a ouvir as notícias do trânsito em Lisboa e a pensar que foi a melhor decisão que tomámos.

 

(O desaparecimento das chuchas de que falo neste post continua a ser um mistério.) 

 

A casa 

 

 

 

Não há como um dia cinzento de chuva para nos lembrar de que temos uma rotina. A minha (nova rotina) ainda está a instalar-se calmamente, com a paciência de quem sabe que vem para ficar. Ou assim espero.

Gosto de rotinas. Dão-me uma estranha sensação de segurança. A rotina que me foi mais fácil de adquirir foi aquela que depende maioritariamente de mim, o meu trabalho. Cumpro os horários com rigor e na pausa para almoço vou aparando as pontas à casa, arrumando uma ou outra caixa que ainda espera na fila, estendendo a roupa, regando as plantas, escrevendo um post. Do que mais gosto de fazer nesta casa, além de abrir as janelas de manhã para deixar entrar o sol (não foi o caso de hoje), é ir estender a roupa à corda do lado de fora. Poder fazer a lida da casa ao ar livre devia ser um direito adquirido. Aposto que se pudesse engomar no quintal também me iria passar a saber bem.
 
Fora as caixas ainda por arrumar que escondemos na garagem e que vamos buscando à medida que nos vamos lembrando, ou esforçando por lembrar, a casa ficou catita. De uma casa de fim-de-semana meia abandonada nos afectos, à qual prestávamos apenas a atenção que se dá às coisas temporárias, passou a ser uma casa acolhedora, convidativa, reconfortante para a alma, quente para o coração e fresca para a pele, uma casa de família. E com vontade própria. 
Personifiquemo-la, então.
Descobri que a casa é dotada de um humor muito especial. Talvez ache que tem direito ao seu momento de vingança por só agora estarmos a cuidar dela. Talvez seja apenas uma casa como aquelas nos romances latino-americanos, uma mansão com personalidade própria, espírito irreverente e refúgio de segredos e almas penadas. Tirando a parte da mansão, a casa prega-nos partidas. Ainda mal nos tínhamos instalado e já começavam a desaparecer coisas. Não é de estranhar, pensam vocês, acabaram de mudar de casa, têm meia vida enfiada em caixas, esperam encontrar tudo aquilo de que precisam sem vasculharem em, pelo menos, 8 caixas diferentes? Mas quando as coisas desaparecem à nossa frente já começo a franzir o sobrolho. Estava ali e já não está. Primeiro foi a chucha e, de repente, foram todas as outras chuchas, o que deu origem a uma pequena crise resolvida com uma ida de urgência ao único supermercado mais próximo. Depois foram as chaves. Estavam ali e já não estavam. Como um passe de magia, daqueles em que não conseguimos descortinar o truque, mas sabemos que ele existe, as coisas desaparecem. Eu acho-lhe piada, à casa, convivemos muito e acho que já nos entendemos. Ela também já deve começar a gostar mais de mim porque, aos poucos, durante esta semana, começou-me a devolver as coisas perdidas, uma chucha aqui, um casaco aqui, estou certa que as chaves ainda hão-de aparecer, cuspidas de um qualquer buraco negro escondido atrás de uma porta.
Às vezes também há barulhos. De noite ou de dia oiço a casa a respirar. Vou aprendendo a relaxar e a aceitar estes barulhos como sinais de uma nova vida, uma vida sem vizinhos barulhentos ou obras por cima das nossas cabeças. Uma vida sossegada em que de manhã, quando não chove, ainda dá para a mais velha andar um pouco de bicicleta antes da escola. E, depois da escola, tem havido sempre um pouco de praia à tarde. Esperemos que a chuva dê tréguas e nos permita seguir esta nova rotina mais um pouco. Porque esta casa também se vive muito bem lá fora. E estava-nos a saber bem.

Num pequeno ginásio perto de si

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Desde miúda que me inscrevo em ginásios, mas nem por isso sempre fui magra ou atlética. Também nem sempre fui uma frequentadora assídua ou, caso sendo, nem sempre tive uma alimentação equilibrada fora dali. Mas é ponto assente que sempre me dei melhor com ginásios pequenos, de bairro, com menos condições e menos oferta, mas onde sabem o meu nome e estranham se eu não for. No ginásio onde ando há um ano, desde que nos mudámos para aqui e que frequento 4 vezes por semana à hora de almoço, o número de participantes da aula de spinning nos seus dias mais concorridos não chega para, num dos ginásios mais famosos do país (aquele começado em agá, onde andei e odiei), manter uma aula aberta. No entanto, é este grupo coeso de pessoas que vão sempre à mesma hora e se conhecem desde crianças que me dá alento para ir nos dias em que menos apetece. Felizmente, esses dias em que menos apetece vão sendo cada vez menos. 

 

Consigo fazer uma analogia com todos os trabalhos que já tive: sempre preferi trabalhar e sempre trabalhei em micro e pequenas empresas. A única vez em que trabalhei numa multinacional foi uma nódoa no meu currículo e, anos depois, recusaria uma posição bem paga numa outra multinacional por uma remuneração miserável como tradutora num gabinete de vão de escada. Nem toda a gente entende isto, mas sempre achei que o dinheiro não é tudo. Deve ser o meu lado anti-capitalista, anti-urbanista (?), anti-massificação.

Desde que vim morar para Sesimbra, descobri que não gosto de andar anónima na rua e que gosto de ser cliente habitual, que me tratem pelo nome, que me tratem por tu, que conheçam as minhas filhas e saibam onde moro, para me poderem avisar se deixei a luz de fora acesa ou se o meu gato está no quintal da vizinha, ou outra coisa pior. Gosto de ir à piscina e encontrar mães de colegas das minhas filhas e estar um pouco à conversa e gosto que me deixem não pagar no café porque me esqueci da carteira. Gosto que a senhora que cá faz limpeza também me venda viagens e que o meu cabeleireiro só cá venha de 15 em 15 dias. Gosto de ir à vila e encontrar sempre algum colega de escola do homem, apesar de às vezes ser chato porque ele não se lembra do nome deles e fazemos invariavelmente figura de parvos.

Em suma, estou muito feliz por ter saído da cidade. Sempre pensei que me sentisse sufocada com a falta de anonimato e, às vezes, de privacidade, mas a verdade é que me sinto confortada por esta sensação constante de estar sempre acompanhada.

 

[Só para voltar ao tema inicial do post, se há dois anos me dissessem que, um dia, iria ao ginásio 4 vezes por semana por gosto, rir-me-ia muito. E não é para ser má língua, mas o meu treinador tem mais músculos do que os treinadores da nova edição do Peso Pesado.]

Vantagens de viver fora da capital

Sem contar com a praia aqui ao lado, o espaço ao ar livre, ir a pé para a escola das miúdas (ok, só às vezes), a minha jardinagem, ginásio com PT a metade do preço de qualquer ginásio em Lisboa e a sensação de viver constantemente acompanhada (o lado bom da falta de anonimato), descobri agora as massagens de relaxamento* a 8 euros. Também acho que adotámos mais um felino.

É que não quero mesmo mais nada.

 

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* pronto, é só na cervical/lombar, durante meia hora e ainda tenho de levar com sacos quentes nas costas antes da massagem propriamente dita, mas 8 euros??

Meter a mão na terra

 

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É uma espécie de terapia. Semear, regar, transplantar, podar. No final, colher a salsa para os temperos, apanhar a alface para a salada, o alho francês, que comprei a pensar que era cebolinho, para a sopa. Comer aquilo que plantamos é tão bom como vestirmos aquilo que cosemos. Dá uma ínfima e efémera sensação de poder e autossuficiência, mas boa na mesma. Mas, ao contrário de uma blusa que se cose numas horas, o jardim e a mini horta exigem dedicação constante, um carinho diário, uma atenção permanente. Normalmente, rego no final do dia, quando o calor abranda e elas já estão em casa. Gostam de ajudar a regar as plantas (e os próprios pés), a pôr a terra nos vasos (ou onde calhar), a sujar as unhas e a roupa enquanto ignoram os meus protestos para lavarem as mãos antes de pegarem em comida e perguntam se hoje há sopa, quando apanho o último alho francês, que devia ser cebolinho, sobrevivente.

 

Tenho pena de não ter mais espaço, mais terra para plantar mais coisas. Aos poucos, vou percebendo quando se deve podar, vou conhecendo as manhas às plantas e aprendendo as estações e os tempos certos. Estava quase capaz de me atirar às cebolas e aos tomates e assim ter sempre salada fresca para o jantar. Com direito a caracóis, lesmas, minhocas e outros bichos com quem vou aprendendo a conviver e respeitar (menos os gafanhotos, de quem ainda não gosto), e a pôr para o lado, para que não me comam a salsa. Mas acho que estou a deixar morrer o mirtileiro, por isso não devo ser ainda muito boa jardineira. Vale o prazer que dá pôr a mão na terra e rezar para que tarde o dia em que me vai saltar um gafanhoto verde, grande e gordo do meio das margaridas. Até lá, vivo na ingenuidade de achar que já estou a superar a minha fobia, só porque no outro dia dei uma mangueirada a um gafanhoto verde e pequeno sem mandar um grito que se ouvisse na Arrábida.

Estou no bom caminho, pois.

Papagaios à solta

Se o inverno foi um pouco mais calmo por estas bandas, em termos de actividades ao ar livre, a primavera e o verão chegam com promessas de nos cansar o corpo e relaxar a alma. A nossa lista das coisas que queremos fazer com as miúdas esta temporada inclui actividades como seguir as pegadas de dinossauro no trilho da Pedra da Mua, ir ver (várias vezes) o pôr-do-sol ao Cabo Espichel, fazer caminhadas na Arrábida e ir ver os pirilampos à noite (diz que a Arrábida é um dos melhores sítios em Portugal para se ver pirilampos), dar um passeio debaixo de água com este barquinho, retomar o SUP (stand up paddle) na Lagoa de Albufeira (ele, que eu vou ficar a tomar banhos de sol... ah, espera, tenho duas filhas pequenas...) e fazer imensos piqueniques, incluindo na relva do nosso quintal. Além das idas obrigatórias à praia depois da escola, claro...

Mas este sábado, juntámos uma nova actividade à lista: lançar papagaios! Com uma zona ventosa como é o Cabo Espichel aqui pertinho, é imperdoável que nunca nos tenhamos lembrado disso, mas a verdade é que eu nunca tinha lançado papagaios na vida e, se me tivessem perguntado antes se queria, era capaz de não me entusiasmar. Mas quando o Centro de Apoio Sócio Cultural do Zambujal, uma freguesia de Sesimbra, organizou um lançamento de papagaios no Cabo Espichel para o dia da liberdade, não hesitámos. Convidámos uns amigos, a mais velha passou a semana a falar nisso e acabámos por ter uma manhã simplesmente espectacular. Lançar papagaios e controlá-los lá bem no alto pode ser bastante relaxante. É claro que comecei logo a pensar em fazer o meu próprio papagaio de tecido, mas já sei que não vou ter tempo nenhum para isso, por isso vamos ficar com os papagaios da CASCUZ que são bem resistentes.

 

Não podíamos estar mais entusiasmados com a chegada do bom tempo. Como ele diz, um verão vale por dois invernos. E o inverno agora está bem lá longe!

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Rato do campo, rato da cidade

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O ginásio onde treinamos em Sesimbra é uma espécie de ginásio familiar, onde toda a gente se conhece desde há uma vida. Quando comecei, em Outubro, éramos meia-dúzia de gatos pingados na turma da hora do almoço. Um grupo pequeno, coeso, com adeptos regulares e instrutores que se lembram que não fomos à aula passada e nos fazem sentir mal por isso... Mesmo assim, é o ginásio a que tenho ido mais regularmente desde que comecei a frequentar ginásios.

Com a proximidade do Verão, e da praia aqui tão perto, a turma começou a encher e já somos tantos que quase não há bicicletas para todos.

Curiosamente, a lotação máxima desde ginásio seria suficiente para fechar uma aula no Holmes Place, devido ao número insuficiente de alunos. Curiosamente, já fui mais vezes a este pequeno ginásio de bairro desde Outubro do que fui ao Holmes Place, enquanto lá estive inscrita, durante dois anos, na grande cidade.

Passei uma vida a dizer que gostava do anonimato, de passar despercebida. Mas era capaz de estar enganada.

Aldeia

Para tratar de uma questão relacionada com o contrato do gás, entrei numa espécie de loja de electromésticos. Percebi logo que estava mal, não podia ser ali. Lá ao fundo, duas secretárias com duas senhoras que olhavam para mim. Entrei a medo e, entre aspiradores e máquinas depiladoras, perguntei se era ali que podia tratar de assuntos relacionados com o gás. Era. Convidaram-me a sentar e lá fiz o que tinha a fazer, de olho nos aquecedores a óleo atrás de mim. Durante o tempo que esperei houve várias pessoas a entrar para trocar a bilha de gás ou comprar resistências. Depois de concluído o processo, coloquei uma questão à qual a senhora não me soube responder. Foi chamar o chefe de secção ou gerente de loja, não sei muito bem como lhe chamar, que veio ter comigo e me cumprimentou efusivamente, como se andasse comigo no ginásio. Catano, e não é que andava?

(Já referi que a minha instrutora do ginásio é mãe de um coleguinha de escola da Inês?)

E é assim que viver nesta terra destrói qualquer tentativa de anonimato. Por outro lado, vejamos o lado prático: não há muita gente que se possa dar ao luxo de, num só sítio, poder pagar o gás e comprar um ferro de engomar.

Aposto que, quando precisar de ir tratar do contrato da água, vou encontrar o professor de natação da Inês. Ou, quem sabe, a minha nova empregada doméstica? Ah, espera. Essa já trabalha na agência de viagens!

Arco-íris

Há muito tempo que não via um arco-íris assim, tão vivo, tão nítido, de uma ponta à outra. A viagem do centro de Sesimbra até casa pela Arrábida demorou o triplo do tempo. Devo ter parado umas 5 vezes para apreciar a paisagem, o formato três-dê das nuvens, a imensidão do arco-íris, para desenhar no ar as sete cores como na música dos Caricas ("Mamã, mas eu já não acho muita piada aos Caricas. É para bebés, sabes..."). As minhas filhas olhavam para mim surpreendidas e divertidas com os meus guinchos de alegria. Há muito tempo que não via um arco-íris assim, tão vivo, tão nítido, de uma ponta à outra. A câmara do telefone não conseguiu apanhá-lo em toda a sua extensão, mas juro que dava para ver onde começava e onde terminava, os potes de ouro esperando em cada extremidade. Pus-me a pensar se, de todos os arco-íris que já vi na vida, nunca tinha prestado a devida atenção a nenhum ou por que é que só agora é que me espanto por ver um arco-íris assim, tão vivo, tão nítido, de uma ponta à outra. Depois lembrei-me. É que vivi demasiado tempo nas grandes cidades onde os prédios altos só deixam vislumbrar uma parte do arco. E acho que acabei por perder a esperança nos arco-íris da vida. ("Se chove e faz sol, aparece o arco-íris, pois é, mamã?")

Sete anos depois (e eu que ligo tanto a coincidências cronológicas), tenho a oportunidade de uma nova vida. Nova casa, nova terra, novo emprego. É tudo quase tão novo que, por momentos, me deu medo e aquele aperto no peito que não me deixava respirar ali entre a uma e as duas. Mas de repente, a sensação de aperto passou, o coração acalmou e percebi ali, com aquele arco-íris, que não pode chover para sempre.

O texto pode estar cheio de clichés, mas as fotos são sem filtro.





Viver no campo


Costumo dizer que vim viver para o campo, mas é só para me armar. Isto não é campo. Campo, para mim que nunca vivi no campo, é viver numa casa com uma árvore com baloiço, couves no quintal de trás, roupa a secar na corda, 3 ou 4 cães a guardar a propriedade, uma seara a perder de vista e bicharocos a saltitar por todo o lado. A casa mais próxima ficaria a, pelo menos, 3 km de distância e o único estabelecimento comercial de grandes dimensões seria o da vila, a 15 km.

Ora, entre isso e o sítio onde vivo agora há algumas semelhanças, é certo, como a roupa a secar na corda e os bicharocos que, volta e meia, dão um ar da sua graça, mas as diferenças são mais que muitas. Por exemplo, em vez de couves no quintal há alfaces na varanda. Não há searas a perder de vista, mas há a Arrábida como pano de fundo e um relvado onde nos deitamos numa mantinha com o cheiro no ar da relva acabada de cortar. Não há árvores com baloiço, mas há um limoeiro e uma laranjeira que vão deixando cair frutos em cima das nossas cabeças quando vamos à garagem. A casa mais próxima fica a 50 metros e os cães são substituídos por gatos que não guardam coisa nenhuma, mas trazem pulgas para casa como oferenda de amizade. Ainda por cima são todos iguais uns aos outros e difíceis de distinguir como o raio (em contrapartida, têm nomes muito nobres como Pompeu, Teresinha, Elvirinha... e um dia ainda vos falo do galo Sansão que cá viveu em tempos). À nossa porta passam os miúdos a caminho da escola e ao fundo da rua há mais centros de explicações do que cafés em todo o lugarejo. Portanto, animação é o que não falta.

Mas gosto de dizer que vim morar para o campo. Porque na cidade a minha filha não acorda intrigada com o galo da vizinha que canta tão cedo. Na cidade não podemos fazer o jantar com a porta das traseiras aberta. Na cidade as pessoas na rua não têm um sotaque meio alentejanado e o carteiro não apita à porta de casa para me entregar uma encomenda. Na cidade a piscina para a miúda não custa só doze euros por mês. Na cidade o meu gato não espera por mim ao portão do quintal. Na cidade não vejo borboletas aos pares quando vou a pé ao café, nem caracoletas a namorar no vaso do cebolinho.
Não cidade não há nada disto. Há outras coisas, é certo, mas tenho cá para mim que na grande cidade o Baltazar e a Blimunda eram capazes de durar pouco. Estou a falar aqui dos moluscos, é claro.